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O contencioso


Porque o evangelho não é uma doutrina de língua, mas, de vida. O grande reformador João Calvino (1509-1564), consegue em poucas palavras, nos ensinar algo de extrema importância. Nos ensina sobre uma vida piedosa que retrata o evangelho da graça de Deus. A vida do cristão precisa, não apenas por palavras, e sim, por conduta, expressar a sã doutrina.


Tem sido um grande desafio viver uma vida que glorifique a Cristo. A comunidade evangélica tem enfrentado situações desafiadoras em todas as áreas, seja com questões culturais, ideológicas e até mesmo com relacionamentos interpessoais. Cada dia mais os relacionamentos virtuais têm sido alvo de grandes controvérsias. Perceber o quanto estamos longe de uma saudável convivência com o corpo de Cristo nas redes sociais, é importante para destacar um ponto chamado: contendas.


Uma outra questão é perceber que as "contendas" criam dimensões gigantescas e trazem, não somente divisão, como adeptos a cada dia. No meio reformado, essa tem sido uma triste realidade que destoa com aquilo proposto na Escritura. Amantes das controvérsias em torno de temas teológicos, produziram muitos teólogos "fakes" e "super crentinos". A Escritura nos diz claramente:


O que ama a contenda ama a transgressão; o que faz alta a sua porta busca a ruína. — Provérbios 17.19.


Contenda é pecado! Amor a contenda é pecado, pecado esse que mina o coração e reflete um comportamento desprezível. Esse verso nos diz que: quem ama a contenda, ama o pecado. A contenda é um pecado que se encarrega de trazer outros pecados, como a maledicência, a ira, a maldade e orgulho. O próprio verso mencionando em provérbios fala do orgulho, "aquele que faz alta a sua porta facilita sua própria queda".


Em nossos dias, esse amor a contenda é visto de várias formas nas redes sociais, em páginas ou em grupos. Uma vitrine de contendas, relacionamentos destruídos e muitos bloqueados. Cristão contenciosos, não seria isso uma questão trágica em nosso meio? A ânsia da defesa pública e da exposição teológica reformada, para que "likes" alimentem um ego enfermo. Um desejo ardente para oferecer a última palavra baseado em todo arcabouço da filosofia ou teologia, não é menos importante do que manter um relacionamento saudável com um irmão, que, por um detalhe, pensa diferente de você.


A falsa piedade tem convencido a muitos com uma retórica de amor e zelo pela verdade, e ódio contra o pecado. Como disse, certa vez, um pastor reformado sobre suas percepções a respeito desses debates teológicos de Facebook: "A contenda se reveste de falsa piedade, quando o que realmente está acontecendo é amor ao pecado que Deus odeia". A glória de Deus, o bem ao próximo, o verdadeiro zelo pela Escritura estão longe dos debates teológicos das redes sociais, são poucos os que proporcionam realmente santo temor e paz entre os envolvidos.


De fato, é necessário um exame das nossas motivações teológicas, um sondar das nossas intenções. Devemos questionar o propósito de tantas leituras, labor teológico e filosófico, de tanto conhecimento bíblico com um objetivo de apenas satisfazer o ego, e que, por fim, carece bastante de motivações genuinamente piedosas. Muitos outros pastores têm se posicionado contra essa realidade, trazendo a reflexão necessária desse desserviço à fé reformada.


Aqueles que confessam a fé cristã reformada, devem, em todos os âmbitos, manifestar o senso profundo e inequívoco do Soli Deo Glória. Não devemos ter prazer nas contendas, nem muito menos em disputas teológicas. E isso não quer dizer que devemos abandonar o labor teológico, nem um debate saudável. Que o fim de se envolver nesse embate seja a glória de Deus, negando qualquer outra motivação que traga algum prejuízo na comunhão com os irmãos.


O próprio reformador João Calvino não amava a disputa, nem a controvérsia, nem o falar contencioso. O alvo de Calvino era defender a fé com zelo, por amor às ovelhas de Cristo, para a glória de Deus.


A verdadeira sabedoria é humilde, o pai da contenda é o orgulho. Que a nossa oração seja: concede-nos, ó Pai, uma inteligência em sincera humildade e pronta humilhação. A mistura de conhecimento e insensatez é chamada pelos gregos de sofomania, ou seja, o hábito de querer parecer sábio. Lembremos do livro de provérbios, que diz, "o temor a Deus é o princípio da sabedoria" (Pv 1.7).


Deixo aqui, nas palavras do apóstolo, um grande conselho:

E rejeita as questões tolas e desassisadas, sabendo que geram contendas; e ao servo do Senhor não convém contender, mas sim ser brando para com todos, apto para ensinar, paciente; corrigindo com mansidão os que resistem, na esperança de que Deus lhes conceda o arrependimento para conhecerem plenamente a verdade, e que se desprendam dos laços do Diabo (por quem haviam sido presos), para cumprirem a vontade de Deus.


2 Timóteo 2.23-26.

 

Morgana Mendonça dos Santos

Membro da Igreja Reformada em Paulista. Bacharel em Teologia com concentração em Missiologia — STPN, pós graduada em Teologia Exegética — SPN, mestranda em Estudos Teológicos — MINTS. Trabalha com tradução das Escrituras e faz parte do Projeto Missionário Compaixão e Eva Reformada.

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